segunda-feira, 9 de julho de 2012

BLOODLINES, THE ORIGINAL BEGINNING - A HISTÓRIA DE ADRIAN


Nota do editor: quando Richelle Mead começou com Bloodlines, cada capítulo era narrado por um personagem. Essa é a história perdida de Adrian.


Adrian Ivashkov não estava tendo um bom aniversário de vinte e um anos.

Alcançar a idade legal para beber não era grande coisa para ele, visto que ele vinha roubando álcool do armário de licor dos seus pais desde que ele tinha treze anos. Logo, roubar nem era mais necessário. Charme e status podiam dar bebida a ele em quase qualquer bar – de vampiros ou humanos. Isso certamente se provou verdadeiro na noite anterior, levando em conta a ressaca que ele tinha hoje. Ele teve uma ontem também. E no dia antes. Na verdade, Adrian tinha certeza de que ele tinha estado numa dieta de líquidos nas últimas semanas. Estava começando a ficar difícil de dizer onde uma ressaca terminava e a outra começava.

Parte da “dieta de líquidos” era sangue, é claro. Ele precisava disso para sobrevivência, e na verdade, mais ou menos ajudava com as ressacas. Saindo do condomínio de seus pais, ele estremeceu quando a última luz do sol poente atingiu seus olhos muito sensíveis, imediatamente provocando uma dor na parte de trás do seu crânio. Que horas eram? Sete? Oito? Independente de qual fosse, ele tinha dormido até tarde, o que era bom para ele. A luz tinha ido muito mais cedo, e teria poucas pessoas nos alimentadores. Fazia muito tempo que Adrian tinha parado de se importar com o que as pessoas pensavam dele, mas isso não significava que ele queria encarar a mistura de olhares de desprezo e pena que ele tanto recebia ultimamente.

Acordar tarde também significava que ele não teria que ver seus pais antes deles saírem. De qualquer jeito, ele tinha pouco interesse em falar com eles na maior parte do tempo – particularmente seu pai – e certamente não no dia que sua mãe estava começando a cumprir a sentença por perjúrio e roubo. Não que Adrian estivesse muito preocupado com ela. Lady Daniella Ivashkov não veria o interior de uma cela. Ela seria multada, talvez prestando algum tipo de serviço comunitário. Sua posição a protegeria de qualquer coisa além disso, e realmente, com o assassinato e outras violações de leis acontecendo por aqui ultimamente, seus crimes eram as menores preocupações de qualquer um.

Enquanto ele andava através do gramado espaçoso e bem cuidado que compunha o coração da Corte Real dos Moroi, Adrian não evitou em imaginar se sua mãe ainda lembrava que hoje era seu aniversário. Ela geralmente lembrava (sendo muito meticulosa sobre escrever datas importantes no seu livro de compromissos) e magnanimamente iria dizer a ele para “escolher alguma coisa legal” para ele mesmo. E então ela sempre iria lembrar seu pai, que iria dar a Adrian algum rude “tudo de bom”, prontamente seguido de um sermão sobre como Adrian deveria descobrir o que ele iria fazer com sua vida.

No entanto, tia Tatiana nunca tinha dado um sermão nele. Ela lembrava do seu aniversário todo ano, sem que ninguém lhe dissesse, e sempre tinha lhe dado um presente escolhido a dedo. Como rainha dos Moroi, ela nunca tinha comprado os presentes pessoalmente, é claro, mas sempre dava instruções específicas aos seus servos sobre o que ela queria dar para ele. Seus presentes eram sempre extravagantes e bonitos, de pouco uso prático. “Exatamente como você”, ela uma vez o provocou. Ano passado, ela tinha lhe dado abotoaduras incrustradas de rubi. Relembrando esse dia, Adrian franziu a testa e se perguntou onde as abotoaduras estariam agora. Ele não esperava que fosse usá-las muito e tinha sido descuidado. Mas ele nunca tinha esperado que ela fosse morrer também.

Ele iria procurá-las mais tarde, decidiu. Depois que pegasse sangue dos alimentadores. E depois de uma bebida, é claro. Ele não poderia começar seu aniversário sem uma bebida, e além disso, ele devia um brinde para a única pessoa que, se ainda estivesse viva, saberia que hoje era um dia especial.

“Feliz aniversário.”

Adrian parou subitamente. As palavras eram suaves e pequenas, numa tentativa de fala, mas facilmente discernidas pelos ouvidos dos vampiros. Lentamente, ele deu meia volta e encontrou Jill Mastrano parada timidamente atrás dele. Ela era alta para sua idade – quinze anos, se ele lembrava corretamente – e movia seus membros longos com uma certa graça que fazia ela parecer ainda mais alegre e alta. Seu cabelo era uma massa longa, com cachos castanho claro, e seus olhos, observando-o nervosamente, eram de uma cor de jade polido.

“Pequena Jill,” ele disse, colocando um sorriso no rosto que vinha naturalmente para ele, não importava o quão irritado ele se sentisse ou quanto sua cabeça doía. Ele se arrastou em sua direção, se movendo até a sombra de uma macieira que bloqueou a maior parte do céu ocidental. “Com quem, na terra, você está falando?”

“Você,” ela disse. Um pequeno sorriso brincou em seu rosto, e um pouco da timidez diminuiu. “Não esconda. Eu sei que dia é hoje.”

“O que faz você ter tanta certeza? Eu pareço mais velho? Isso é uma coisa muito, muito cruel de se dizer. A próxima coisa que você vai me dizer é que eu estou ficando grisalho. Você é uma destruidora de corações, Mastrano. Uma verdadeira destruidora de corações.”

Adrian ansiava por partir. Os alimentadores chamavam por ele, seu corpo implorando pelo gosto do quente e tentador sangue humano. E então... Uísque. Sim. Era isso que ele queria depois. Mas Jill era uma das poucas ­– muito poucas – pessoas com quem ele não andava irritado ultimamente, e ele estava curioso sobre como ela sabia que era seu aniversário quando ninguém mais sabia. Alcançando dentro do seu bolso, ele puxou seu maço de cigarros e seu isqueiro, torcendo para que um vício pudesse afastar a ânsia por outro.

Com as palavras “destruidora de corações”, as bochechas pálidas de Jill ficaram de um rosa claro. Não deveria ter dito isso, ele percebeu. Ele nem se deu conta. Ele sabia que Jill tinha uma queda por ele há um tempo, uma que ele esperava que ela tivesse superado, já que nada poderia resultar disso. Havia apenas algumas linhas que Adrian não iria transpor. Garotas de quinze anos era uma delas. Ele não deveria encorajá-la. Ele até mesmo tentou parar de usar seu velho apelido: Jailbait*. Ainda assim, flertar era um hábito inconsciente para ele, e muitas vezes escapava.

“Você me disse”, ela explicou. “Você disse a alguns de nós. Há muito tempo. Na St. Vladimir. Nós estávamos juntos um dia, e eu tinha um livro de horóscopo e estava olhando para todo mundo. Você é de Leão. Extrovertido. Pomposo. Confidente. Arro–”

Ela mordeu seus lábios abruptamente, e ele riu. “Pode dizer. Arrogante. Um bastardo arrogante.”

“Não! Eu não acho que você seja,” ela disse firmemente, seus olhos esbugalhados. “De jeito nenhum. Quer dizer, é só um monte de estrelas.”

Suas palavras remexeram um monte de sentimentos estranhos nele, tanto bons quanto ruins. Era legal vê-la assim, como ela sempre fora: uma garota inocente e tímida, dada a explosões de emoções e divagações. Ele tinha visto muito pouco disso nela ultimamente. Mais notável ainda, ele poderia adivinhar quem tinha sido esses “alguns de nós”, e de todos eles, apenas ela tinha percebido seu aniversário. Lisonjeiro. Triste.

“Bem,” ele disse a ela, depois de dar uma longa tragada no seu cigarro, “as estrelas estão certas, e você também. É meu aniversário.”

Ela sorriu. “Você vai ter uma festa?”

Ele cuidadosamente manteve sua expressão exatamente igual, casual e retorcida. “Ah, o que tem de especial nisso? Todo dia é uma festa para mim. Não há motivo para arrastar pessoas para sair numa noite no meio da semana.”

Também nenhum motivo para mencionar que seus amigos provavelmente estavam preocupados em fazer qualquer coisa, de qualquer jeito. Tia Tatiana, ele pensou. Tia Tatiana teria me levado para jantar. Ele imaginou que se ele queria mesmo celebrar, ele poderia achar quantos “amigos” – particularmente mulheres – mais que felizes de desfrutarem uma festa improvisada hoje à noite. Talvez isso nem fosse uma ideia tão ruim – mas nada para a sensibilidade delicada de Jill.

“Além do mais,” ele acrescentou grandiosamente, “eu tenho certeza de que você não poderia ir. Aposto que você tem algum encontro bem quente essa noite, heim?”

Alguma coisa no rosto dela mudou, a expressão entusiasmada e ansiosa escureceu um pouco. Seu modo nervoso retornou, e Adrian sentiu suas sobrancelhas erguerem. Isso foi inesperado.

“Você tem um encontro!”

Jill lentamente sacudiu a cabeça. “Não. Não esse... não esse tipo. Eu vou ter um jantar com... com L-lissa e minha família.” Seus lábios tiveram dificuldade de formar o nome. “Nós vamos discutir meu, hum, futuro.”

Por um breve momento, Adrian permitiu a si mesmo considerar que apesar de tudo, havia alguém no mundo cuja vida estava mais bagunçada que a dele. O rosto de Jill estava firme, mas seus olhos a traíam. Um mês atrás, Jill estava em férias de verão na casa dos seus pais em Michigan, ansiosa para ir para a escola secundária na Academia St. Vladimir. Então ela descobriu um segredo profundamente escondido – o mesmo que sua mãe estava sendo punida por esconder. O pai biológico de Jill era da realeza, parte de uma que família que estava desaparecendo rapidamente. Ele morreu anos atrás, e agora sobrara apenas um único membro da família: a meia-irmã de Jill, Lissa Dragomir. Lissa Dragomir – também conhecida como Rainha Vasilisa, primeira do seu nome, a recentemente eleita governante dos Moroi.

Por curiosidade, Adrian convocou um pouco da magia que vivia dentro dele para tentar ver a aura de Jill, a área de luz que rodeava todo ser vivo. A magia veio lentamente, um pouco atrofiada pela farra de bebida da última noite, mas ainda trouxe a precipitação e alegria como sempre. Todos os Moroi manejavam algum tipo de elemento mágico, com os básicos sendo os mais comuns: fogo, água, terra e ar. Apenas alguns “sortudos” como Adrian possuíam o quinto, espírito, que oferecia maior alcance que qualquer outro elemento. Também, eventualmente, resultavam em insanidade.

No fim ele não conseguiu se fixar bem na aura de Jill. Seu controle do espírito não estava assim tão bom hoje. Ela ostentava um monte de cores, mas sumiam e piscavam. Medo, ele presumiu. Nervosismo. Nada que ele não tivesse lido no seu rosto. Sonya Karp, outra usuária de espírito, provavelmente teria conseguido decifrar mais. Ela tentou ensiná-lo, mas ele tinha pouca paciência para aprender ultimamente – ou até mesmo para ela, às vezes. Sua atitude otimista e renovado amor à vida não entrosava bem com seu humor negro. Ele relaxou na magia, e a aura de Jill desapareceu de sua vista.

“Talvez você possa ir também,” ela disse de repente. Ansiedade tomou conta de suas expressões novamente, embora estivessem contidas. Ela estava preocupada sobre ultrapassar seus limites. “Então você meio que teria uma festa de aniversário.”

Adrian riu e jogou a ponta do cigarro no chão, espremendo-o com a ponta do seu sapato. “Não soa como uma festa. Parece mais uma reunião de família.”

“Mas outras pessoas estarão lá!” Jill exclamou. “E Lissa não se importaria.”

Não, Lissa provavelmente não se importaria, mas as outras palavras de Jill enviaram alarmes para sua cabeça. “Que outras pessoas?”

“Bem, como eu disse. Lissa. Meus pais. Christian. Ro–”

De novo Jill parou antes de terminar uma palavra perigosa, mas era tarde demais. Ele ouviu o nome em sua cabeça e no seu coração, onde perfurou como um punhal. Rose. Imagens dos olhos escuros apareceram na sua mente, olhos penetrantes e uma cabeleira igualmente escura. Um corpo explodindo de tensão, bonito em suas formas e no perigo que apresentava. Adrian tateou por outro cigarro, olhando para baixo para que Jill não pudesse ver sua agitação em busca de ar, ou a dor e a raiva que seus olhos sem dúvida estavam mostrando.

Rose.

Ela estaria onde quer que Lissa estivesse. E onde quer que Rose estivesse, ele estaria também. Rose e Dimitri Belikov dificilmente estavam separados na Corte. Adrian tinha ficado fora do seu caminho para evitá-los desde a coroação de Lissa e apenas tinha topado com eles duas vezes. A primeira vez, eles estavam no dever de guarda, acompanhando Lissa para o encontro do Conselho. Rose e Dimitri moviam-se quase como uma única entidade, como pares combinados de lobos ou leões, os dois atentos e mortais enquanto estudavam o ambiente, sem tomar detalhes ou pessoas em específico.

A segunda vez, Adrian os vira longe do trabalho. Eles não o notaram. Eles estavam muito envolvidos um no outro, sentados do lado de fora num dia de sol. Ela inclinou-se sobre Dimitri, parecendo satisfeita de um jeito de Adrian nunca tinha visto – certamente não enquanto ele namorou com ela. Ela disse alguma coisa que fez Dimitri rir, trazendo um sorriso para a expressão dura do outro homem, um sorriso que Adrian não pensava que podia ser possível. Adrian ainda não sabia qual encontro o aborrecia mais, o formal ou casual.

Ele queria dizer para Jill que poderia levantar uma lista de cem outras coisas que ele preferia fazer do que sentar durante um jantar onde Rose e Dimitri estivessem presentes. “Estar em coma” e “furar meus olhos” estavam perto do topo da lista. Um jantar como esse não era forma de se passar seu aniversário. Não era nem forma de se passar qualquer dia. A idéia anterior de encontrar qualquer companhia feminina essa noite soava cada vez melhor. Mas primeiro, o sangue. Então, a bebida. Por Deus, ele precisava mesmo de uma bebida.

As palavras estavam nos seus lábios, uma recusa polida a oferta de jantar de Jill. Ele podia ver pelo seu rosto que ela estava esperando isso também. Mas então, num bizarro momento de clareza, ele percebeu algo que ela não tinha percebido. Nós vamos discutir meu futuro, ela disse. Não. Ele sabia, sem saber como sabia, que eles iam contar para ela seu futuro. Houveram muitas especulações sobre o que iria acontecer com Jill, que nem mesmo era um princesa por um mês ainda, e cuja existência foi tudo que manteve Lissa no seu trono.

Alguém finalmente decidiu, ele se deu conta. O grupo decidiu. Ou talvez alguém o fez. Adrian não tinha certeza de como seria, mas ele quase podia imaginar a cena essa noite. Lissa iria trazer a notícia no seu jeito prático e suntuoso, enquanto Jill e seu padrasto – quem sem dúvida estava mais próximo agora, ou então eles nem estariam se encontrando – assentiam juntos mudos. E Rose... Rose estaria lá para amenizar a tensão do melhor jeito que pudesse, sorrindo e brincando, dizendo a Jill que o que quer que eles planejassem, iria ser grande e maravilhoso.

Jill não poderia lutar com um grupo como esse. Nem mesmo Adrian poderia, mas por razões que nem ele mesmo entendia completamente, ele decidiu que não deixaria Jill lidar com aquilo sozinha. Talvez ele ainda estivesse bêbado e nem percebesse. “Que horas será o jantar?” ele perguntou.

Jill estava surpresa por ouvir aquelas palavras tanto quanto ele estava por falá-las. Gaguejando, ela informou o horário e local, e ele prometeu que estaria lá. Bufando, ele se afastou, percebendo que não importava. O que era mais uma decisão tola em uma vida cheia delas? Ele iria ao jantar. Ajudaria Jill sendo mais infeliz do que ela era.

Mas primeiro – o sangue. E então a bebida. E provavelmente mais outra bebida.


*chave de cadeia